Por Brunno Almeida Maia
Desde a emergência da teoria da moda no final do século 19, especialistas afirmam que o “tempo” é o ser da moda, mas a filósofa Gilda de Mello e Souza (1919-2005), no livro O espírito das roupas: a moda no século dezenove , analisa a moda como fenômeno social, incluindo, de modo inédito, a categoria “espaço” nessa discussão. O look Corpo e roupa, desenvolvido pelos artistas Detanico Lain em parceria com o estilista Walter Rodrigues, durante a segunda temporada do MASP Renner – projeto que convida artistas e estilistas a colaborarem realizando looks incorporados ao acervo do museu –, materializa a definição de Mello e Souza sobre a moda, aproximando-a da arquitetura: a forma da roupa como medida do espaço. O look dialoga com a arquitetura, ou melhor, com a matemática enquanto abstração do pensamento e do espaço, e sua modelagem é estruturada a partir de um alfabeto construído com círculos, semicírculos, triângulos e retângulos. Assim, Corpo e roupa é uma forma tridimensional para as palavras no título. Os croquis desenvolvidos não são meros desenhos técnicos, mas mapas do processo criativo. É pelo desenhar a espacialidade que o corpo-vestido refaz a “beleza” de múltiplas gestualidades. Inacabados, os gestos em movimento apontam outros caminhos para a arte, para a moda e para a experiência do pensamento: a ideia de que habitamos o espaço singular de nossas peles, construímos a espacialidade pela roupa, desenhamos a nossa “caligrafia dos gestos” como potência de uma escritura no e pelo corpo.
— Brunno Almeida Maia, Pesquisador em filosofia pela Unifesp, curador de moda, 2023
