MASP

Giuseppe Mazzuoli

Diana adormecida, 1690-1700

  • Autor:
    Giuseppe Mazzuoli
  • Dados biográficos:
    Volterra, Itália, 1644-Roma, Itália ,1725
  • Título:
    Diana adormecida
  • Data da obra:
    1690-1700
  • Técnica:
    Mármore
  • Dimensões:
    55 x 169,5 x 81,5 cm
  • Aquisição:
    Doação Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira S.A.; Banco do Estado de São Paulo S.A, Antonio Sanches de Larragoiti Junior; Miguel Maurício e Clemente de Faria, 1950
  • Designação:
    Escultura
  • Número de inventário:
    MASP.00031
  • Créditos da fotografia:
    João Musa

TEXTOS



Membro de uma família de artistas e arquitetos, Giuseppe Mazzuoli foi iniciado na escultura pelo irmão, Giovan Antonio, em Siena. No início da juventude, mudou-se para Roma, onde complementou sua formação no ateliê de Ercole Ferrata (1610-1686). Sua primeira encomenda, o Cristo morto (1671) do altar da igreja de Santa Maria della Scala, em Siena, chamou a atenção de Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), com quem trabalhou posteriormente em diversos projetos em Roma. Dentre os escultores associados a essa fase do barroco italiano, Mazzuoli foi o que mais assimilou as características de Bernini, em especial a figuração do movimento e da dramaticidade nas vestes. A escultura do MASP, que chegou a ser atribuída a Bernini por alguns historiadores, foi produzida na maturidade de Mazzuoli para o Palácio Barberini, em Roma. A Diana adormecida é uma variação de antigas imagens que mostravam uma ninfa, figura da mitologia greco-romana associada à inspiração e às artes, adormecida ao lado de uma fonte. Seu primeiro precedente seria a escultura Ariadne adormecida (1512), associada a um sarcófago que servia como fonte no Belvedere do Vaticano. A marca da meia-lua, o arco e a flecha nas costas, presentes na escultura, acompanham toda a iconografia de Diana, divindade romana da caça e da lua.

— Equipe curatorial MASP, 2017

Fonte: MASP: Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, São Paulo: Instituto Cultural J. Safra, 2017. (Coleção museus brasileiros)




Por Cristiane Rebello Nascimento
Pascoli noticia que Mazzuoli teria esculpido para o cardeal Barberini a estátua de uma Diana, nos mesmos anos em que lhe vendeu a estátua do Adônis que acabara de finalizar. Mas, em Roma, estabeleceu-se, em algum momento, uma atribuição tradicional da Diana Adormecida ao grande escultor do barroco romano, Gian Lorenzo Bernini (Nápoles, 1598 – Roma, 1680). Como Bernini trabalhou para Urbano VIII (Maffeo Barberini) durante todo o seu papado, e depois para seus cardeais-sobrinhos, pode-se pensar que essa atribuição se deva à localização da estátua no palácio da família e às suas semelhanças genéricas com o estilo de Bernini. O primeiro autor a debruçar-se sobre a questão da autoria da Diana é Fraschetti (1900, pp. 138-139). Ele nota em seus traços graciosos semelhanças com a obra juvenil de Bernini, mas afasta a possibilidade de ser de sua autoria. Em 1916, Muñoz data a obra como sendo do último quarto do século XVII. Para ele, os traços antiqüizantes da estátua, já notados por Fraschetti, desautorizam a atribuição a Bernini. Num artigo de 1952 (pp. 55-57), Pietro Maria Bardi, então diretor do Masp, tentará, sem sucesso, repor a hipótese da tradicional autoria berniniana, que acreditava ser a única indicação segura da obra. Já em 1928, Rudolf Suboff introduzira a Diana na literatura crítica a respeito de Giuseppe Mazzuoli, considerando pela primeira vez a notícia de Pascoli, repetida sucintamente por Della Valle (1786, p. 445). Logo depois, incorpora-a definitivamente ao corpus de obras do escultor (1930, p. 319). Riccoboni (1942, pp. 233-234), guiado por Pascoli e por Suboff, lançará a hipótese de uma datação ao redor de 1703. Mas a data mais aceita para sua execução é a de 1709 (Martinelli 1987, p. 217 e Gentilini e Sisi 1989, p. 267), pois o biógrafo afirma que a Diana fora esculpida nos anos do término da estátua do Adônis, assinada em 1709 (Faldi 1960, p. 134). Essa data, no entanto, deve ser descartada diante do inventário, de 1700, dos bens do palácio Barberini, publicado por Montagu (1991, p. 200, n. 15). Por meio dele, sabe-se que, naquele ano, a Diana encontrava-se sobre o sarcófago que a acompanhou até o Masp, o que antecipa a sua execução para os anos finais do século XVII. Ainda graças ao inventário pode-se determinar com certeza qual dos cardeais Barberini foi o comitente da estátua. Trata-se do cardeal-sobrinho Francesco (1597-1679), vice-chanceler da Igreja e fundador da Biblioteca Barberini. O tema da Diana Adormecida vai surgir apenas no século XVI como variante do tema moderno da ninfa adormecida ao lado de uma fonte. O seu primeiro precedente visual importante é a estátua antiga de Cleópatra ou, como se descobriu mais tarde, de Ariadne Adormecida, que, em 1512, foi associada a um sarcófago antigo para servir como fonte no Belvedere do Vaticano. Essa sistematização inspirou várias fontes de particulares ao longo do século, como a dos jardins do cardeal Domenico della Rovere, primo do futuro Júlio II, a dos jardins Cesi, ou a célebre dos Horti colotiani. Numa gravura de Francisco de Holanda, pode-se ver que a Ariadne ficava em um nicho de onde escorria a água para um sarcófago abaixo dela, que lhe servia de bacia. O modelo dessa iconografia é literário: a novela alegórica intitulada Hypnerotomachia Poliphili, escrita pelo dominicano Francesco Colonna (1523-1527) e publicada em Veneza em 1499 por Aldo Manuzio, que descreve jardins fantásticos, como o de Vênus, cujo elemento principal é uma “soporata nympha”. Na pintura, pode-se observar o mesmo tipo de derivação temática. Lucas Cranach, o Velho (1472-1553), pinta a partir de 1518 uma série de cenas de ninfas adormecidas ao lado da fonte. Em algumas dessas composições vai introduzir os atributos tradicionalmente associados a Diana: o arco e aljava com flechas e um grupo de veados. Não se trata ainda de Dianas adormecidas, mas apenas de “Nympha sculpta iacens sub phatre & arcu”, descritas nas Inscriptiones sacrosanctae vestustatis de Apianus (1534). Não é improvável que a Diana Adormecida do Masp tenha sido pensada em função de uma fonte, embora não se tenha notícia de ter efetivamente ocupado essa função. Há vários indícios disso: a qualidade do mármore, com muitos veios, e a sua associação com o sarcófago romano, no palácio Barberini, que irá perdurar até a aquisição conjunta das duas peças pelo Masp. Um importante precedente, que Pansecchi precisa como o modelo direto para a Diana Adormecida do Masp, é a fonte de Diana no ângulo externo do palácio, no Quadrivio delle Quattro Fontane, também do século XVI (1959, p. 36). A associação estátua-sarcófago, de qualquer forma, assinala o gosto erudito do colecionismo do período, do qual o do cardeal Francesco é um exemplo. Aqui, sem dúvida, ela refere-se aos modelos romanos de fontes com ninfas adormecidas. O tema da Diana Adormecida, que alcançará grande sucesso na pintura francesa do século XVIII, tem ainda como precedente visual importante a figura de Diana Adormecida que Pietro da Cortona, em meados de 1640, afresca no teto do palácio Pitti em Florença. Nesse caso, a associação com a fonte desaparece. Cortona insere a Diana num projeto decorativo em que a pacificação é o argumento central, acentuando assim seu caráter lunar de apaziguadora dos afetos.

— Cristiane Rebello Nascimento, 1998

Fonte: Luiz Marques (org.), Catálogo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, São Paulo: MASP, 1998. (reedição, 2008).



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