MASP

Jacopo Tintoretto

Lamentação sobre o Cristo morto (ou Pietá), 1560-65

  • Autor:
    Jacopo Tintoretto
  • Dados biográficos:
    Veneza, Itália, 1518-Veneza, Itália ,1594
  • Título:
    Lamentação sobre o Cristo morto (ou Pietá)
  • Data da obra:
    1560-65
  • Técnica:
    Óleo sobre tela
  • Dimensões:
    95 x 141 x 2,5 cm
  • Aquisição:
    Doação Gladston Jafet, 1947
  • Designação:
    Pintura
  • Número de inventário:
    MASP.00023
  • Créditos da fotografia:
    João Musa

TEXTOS



Apelidado Tintoretto por ser filho de um tintureiro, Jacopo Robusti (1518-1594) foi um dos principais pintores na segunda metade do século 16. Influenciado por Ticiano (1490-1576), o mais notável pintor veneziano da época, segue uma das principais características da escola veneziana desde o século anterior: o forte uso da cor, tanto como estrutura como para cativar emoções. Tintoretto ficou conhecido pelo conjunto de pinturas da Scuola Grande di San Rocco e por cenas da vida de são Marcos, carregadas de uma luz dramática. A Lamentação sobre o Cristo morto (ou Pietà) (1560-1565) foi realizada quando o ateliê de Tintoretto funcionava em plena atividade. Na iconografia cristã, a lamentação pode aparecer em duas passagens da história de Jesus: a deposição da cruz e o sepultamento. Em ambas variações, Cristo está nos braços de sua Mãe, imagem que conhecemos como Pietà, o momento em que a Virgem chora a concretização do destino trágico de seu filho. Na pintura de Tintoretto, no entanto, não há nenhum desses marcadores que situe a cena, e sim uma paisagem, como se estivessem num bosque. Na vegetação, auréolas e vestes, os ocres, vermelhos e dourados dão um tom quente à pintura, diferente da iluminação relampejante que vemos em obras anteriores de Tintoretto, trazendo uma atmosfera acolhedora, um lamento mais intimista. Halos delineiam as cabeças da Virgem Maria e são João Evangelista delicadamente, um modo de identificar sua santidade e, simultaneamente, seu lado humano.

— Equipe curatorial MASP, 2020





A obra Lamentação sobre o Cristo Morto (ou Pietà) liga-se intimamente à mesma 'cena pintada por Tintoretto para a decoração de uma luneta (Pinacoteca Brera de Milão), a ponto de Von der Bercken (1942, p. 110) considerar a tela do Masp, quando ainda estava na coleção Contini Bonacossi, “um esboço” (Vorwurf) ou uma “invenção algo anterior da Pietà de Brera, datada de 1563”. A atribuição é reiterada por P. Toesca em carta a P. M. Bardi de 11/7/1947, que a situa “entre as obras mais belas e mais raras do período juvenil do mestre”. Toesca prossegue, enfatizando que de Tintoretto a obra possui “o vigoroso contraste de valores de claro-escuro, temperado porém pela influência de Tiziano, que leva o pintor a efeitos delicados de composição, de atitudes, de cor, sem nada diminuir de seus dotes e das características mais individuais que em cada detalhe fazem reconhecer a mão do mestre. Por toda a parte encontra-se o toque rápido e expressivo de Tintoretto”. Em uma datação em torno de 1545, insiste também Giorgio Pudelko (carta a P. M. Bardi, de 24/7/1947). Por sua vez, Giuliano Briganti (carta a P. M. Bardi, s/d.) reforça a atribuição ao pintor, mas data a obra “com uma certa precisão entre os anos de 1560 e 1570, dada a estreita relação com a conhecida luneta de Brera datada de 1563”. Contrariamente a Von Bercken, entretanto, Briganti julga “tratar-se de uma versão posterior, seja pelas características que a avizinham das obras mais tardias de Robusti, seja porque parece evidente que a densa composição das quatro figuras, ainda que aqui se tenha dilatado e ‘descentrado’, nasceu para ser incluída no círculo de uma luneta. Isto pode induzir a datar a pintura para além de 1563, em um momento não distante de 1570”. Como Briganti observa igualmente, há ainda outras versões coevas do tema, como a do Escorial, com um idêntico José de Arimatéia, e a da coleção Brass de Veneza. A datação da obra em um momento imediatamente posterior à luneta de Brera foi, enfim, adotada também por De Vecchi (1970, p. 103, n. 155b), que a qualifica como uma réplica autógrafa “com poucas variantes” da obra do Museu de Milão. Malgrado suas semelhanças, deve-se observar que as obras de Milão e de São Paulo não representam a mesma cena. A tela de Brera é uma Deposição da Cruz, enquanto a do Masp é uma Lamentação sobre o Cristo Morto, cena que se intercala no ciclo cristológico entre a Deposição da Cruz e a Deposição no Túmulo. A Lamentação sobre o Cristo Morto, do Masp, não é relatada em nenhum dos textos evangélicos e comparece na iconografia apenas a partir do século XII, segundo Réau (1957, ii, p. 519), “sob a influência das Meditações dos Místicos, a menos que não se tenha simplesmente inspirado no rito popular das lamentações fúnebres que persiste ainda hoje em todo o Oriente mediterrâneo e mesmo na Córsega”. Tintoretto situa a Lamentação do Masp em um espaço mais distendido, ao fundo do qual se descortina uma paisagem crepuscular da maior riqueza tonal e encantamento lírico. Iconograficamente, a invenção é uma livre adaptação da cena, que é situada em um bosque, sem referência alguma à assim chamada pedra de unção (hoje venerada na igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém), sobre a qual o cadáver do Cristo teria sido chorado. A iconografia dessas elegias fúnebres originam-se, em todo caso, na arte bizantina, na qual tomam o nome de Trenas. Elas chegam à Itália no século xiv e de lá difundem-se por toda a Europa. Quatro ou cinco anos após a criação dessas Pietà, desembarcava em Veneza, em 1567, com apenas 22 anos, El Greco. O impacto de Tintoretto é tão forte que a Pietà que El Greco pintará quase trinta anos depois, por volta de 1595, é ainda uma reminiscência da composição de Tintoretto conservada nas duas versões dos museus de Milão e de São Paulo.

— Autoria desconhecida, 1998

Fonte: Luiz Marques (org.), Catálogo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, São Paulo: MASP, 1998. (reedição, 2008).



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