Por ocasião de uma oficina de serigrafia cujo objetivo era ensinar ativistas a estamparem camisetas para a manifestação do Orgulho LGBTQIA+ em Buenos Aires, surge o não grupo (como ele se autodefine) Serigrafistas Queer [SQ]. O coletivo, composto de artistas, ativistas e público espontâneo, conjuga técnicas de artes gráficas com slogans e frases‑protesto, que são impressos em faixas, camisetas e peças de tecido. Por meio de encontros periódicos, xs SQ propõem uma discussão sobre as potencialidades de palavras de ordem oriundas da dissidência, as estratégias para uma maior disseminação dos movimentos do desejo, e a produção de aparatos móveis que facilitem as impressões serigráficas e com estêncil. Como um desdobramento dessas reuniões, surge o Arquivo de Serigrafistas Kuir (ASK), um acervo múltiplo, em movimento, e cuir/kuir/queer em seu conceito de organização, que reúne todo o conteúdo produzido coletivamente ao longo dos anos: adesivos, bandeiras, camisetas, esboços de frases, cartazes, material documental e um inventario de telas. O material é reutilizado a cada ano nas Marchas do Orgulho de diferentes cidades argentinas e esporadicamente em outros países. Em Histórias feministas, xs Serigrafistas Queer participam com sete serigrafias acompanhadas de breves relatos que contam os processos de concepção de cada obra. Uma delas é Corpo estranho, obra de Matheusa Passareli, uma artista (assassinada em 2018 no Rio de Janeiro) que participou de uma oficina com xs SQ no MASP em 2016. A obra de Matheusa, assim como sua militância e a reverberação de sua morte, converteu‑se em símbolo de luta e de resistência, em toda a América Latina, para as existências que desmantelam as regras de gênero da cis‑heteronormatividade branca e, dessa forma, transitam entre as dimensões da fragilidade do corpo e da saúde mental, e da forca conquistada pela promoção de autonomia e visibilidade das identidades políticas dissidentes. As ações dxs SQ acontecem, muitas vezes, em contextos artísticos, mas é na construção de uma consciência política elaborada nas ruas, durante manifestações e eventos afirmativos das causas defendidas pelas dissidências sexuais e de gênero, que o trabalho alcança a dimensão do ativismo e dissemina vozes em luta.
— Beatriz Lemos, mestre em história social da cultura, PUC‑RJ, 2019
Por Anelise Valls
Na exposição Histórias feministas: artistas depois de 2000 (MASP, 2019) o não-grupo argentino Serigrafistas Queer participou com um corpus de frases e imagens reflexivas e críticas em bandeiras, cartões, pôsteres, peças de roupas que aludem a políticas sexuais e de identidade. Cada matriz de estampagem e seus slogans fazem parte de um conjunto de experiências que ganham o espaço público no contexto da Marcha do Orgulho LGBTIQ que acontece todos os anos em diferentes cidades da Argentina. Através de intervenções e ações gráficas, todos os códigos abertos criados são disponibilizados para serem facilmente reapropriados e criar novas alianças políticas em diferentes lugares. Desses encontros criativos emergem o amplo repertório de denúncias e provocações, dentre os quais destaca-se reivindicações sobre direitos reprodutivos Mi cuerpo mi decisión, Aborto legal es vida, e discursos que são associados às lutas pela emancipação dos corpos e das sexualidades não normativas: Fanchona Sapatão Torta Caminhoneira Lesbiana, Ni Varón, Ni Mujer, Ni XXY, Ni H20, Archivo Nuestro Tiempo, Nuetro Deseo, Nuestras Voces, Somos Malas Podemos ser Peores, Amo a mi mamá travesti, Estoy gay, Sos re linda Ley 26.485.
— Anelise Valls, mestre em Filosofia da Arte, USP, 2021