Ao revelar toda a complexidade instaurada em microuniversos insurgentes, Virgínia de Medeiros institui seus experimentos artísticos como processos de vida. Seu trabalho transita entre a linguagem documental, a fabulação e a presença de seu corpo ao experimentar recursos tecnológicos, fotográficos e audiovisuais. Em Guerrilheiras (2017), a artista retrata doze mulheres moradoras da Ocupação Hotel Cambridge, em São Paulo, ao lado de suas ferramentas de trabalho e luta. O diálogo que se estabelece nas fotografias se pauta na construção de imagens de guerreiras e heroínas personificadas nesses corpos, em que o conflito muitas vezes é o próprio cotidiano. Essas mulheres compõem a força feminina atuante nos núcleos de decisões da Frente de Luta por Moradia (FLM) e do Movimento Sem Teto do Centro (MSTC), ambos de São Paulo. De Medeiros possui contato com esses movimentos desde 2016, quando participou do Programa de Residência Artística Cambridge, colaborando, muitas vezes, em contextos que extrapolam o campo artístico, como em registros de ações diretas da militância ou na intimidade do dia a dia da ocupação. Dessa relação de cumplicidade, surge também o projeto Alma de bronze (2016‑18), com depoimentos em vídeos das militantes. No acesso à obra de De Medeiros, fica evidente o poder feminino exercido a partir do ativismo político, um encontro de forças capaz de minar os mecanismos do patriarcado e do sistema de controle capitalista.
— Beatriz Lemos, mestre em história social da cultura, PUC‑RJ, 2019