A trajetória artística de Letícia Parente (Salvador, Bahia, 1930 – Rio de Janeiro, 1991) teve início após vários anos de formação no campo da ciência, no qual obteve o doutorado em química e desenvolveu uma reconhecida carreira profissional como cientista, tanto como professora como pela publicação de ensaios e livros. No início dos anos 1970, quando chegou ao Rio de Janeiro vinda de Salvador, Parente começou a estudar técnicas de impressão em paralelo ao seu trabalho científico. Seu interesse pela arte rapidamente a colocou em contato com uma comunidade de artistas, incluindo Anna Bella Geiger, Ana Vitória Mussi e Sonia Andrade, entre outros, com quem ela compartilhou ideias e, acima de tudo, a convicção de que, por meio da arte, poderiam encontrar um espaço favorável à liberdade de expressão no contexto de uma ditadura civil-militar repressiva (1964-85). O grupo, que experimentou diversas técnicas, incluindo vídeo, acabou se tornando pioneiro desta mídia no Brasil. Explorando a chamada videoarte, uma tecnologia nova na época, esses artistas puderam expressar suas ideias sobre os problemas políticos e sociais que a população estava vivenciando. O trabalho de Letícia Parente foi recentemente exibido nas exposições Radical Women: Latin-American Art, 1960-1985 [Mulheres radicais: arte latino-americana], no Hammer Museum, em Los Angeles, na Pinacoteca de São Paulo e no Brooklyn Museum, em Nova York; Histórias da sexualidade, no MASP; e Feminist Avant-Garde of the 1970s [Vanguarda feminista dos anos 1970], na Sammlung Verbund, em Viena, entre outras.
Esta exposição apresenta uma seleção de cinco vídeos representativos e fundamentais para se entender o trabalho de Parente. Com uma grande austeridade de recursos, o corpo, a casa, o guarda-roupa e o próprio enquadramento da tela de projeção se tornam espaços metafóricos para falar de uma condição humana, feminina e socialmente determinada a viver confinada sob parâmetros estabelecidos por um sistema patriarcal, ditatorial e restritiva. A metáfora pode ser estendida à representação de uma situação política específica que restringia direitos civis da população, encarnada pelo ponto de vista de uma mulher na intimidade de seu lar. Após os recentes períodos de confinamento vividos globalmente, no contexto da pandemia, as ações que estes trabalhos apresentam assumem uma nova atualidade e outras perspectivas de interpretação.
Sala de Vídeo: Letícia Parente é curada por María Inés Rodríguez, curadora-adjunta de arte moderna e contemporânea, MASP