O artista Kader Attia (Seine-Saint-Denis, França, 1970) passou parte da sua vida entre a Argélia e a República Democrática do Congo, países africanos marcados pelo colonialismo. Na videoinstalação Open Your Eyes [Abra seus olhos] (2010) exibida nessa sala, Attia justapõe duas projeções: de um lado, uma série de fotografias de veteranos da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) com ferimentos brutais no rosto, antes e depois de cirurgias plásticas de reconstrução; de outro lado, imagens de esculturas africanas que sofreram reparos, conservadas em museus europeus e americanos. Boa parte da arte africana tradicional encontrada nesses museus foi pilhada durante a colonização europeia na África, pano de fundo para os embates da Primeira Guerra. Pesquisando coleções desses museus, Attia identificou que muitos objetos africanos reparados ainda em seu contexto de origem são segregados dos objetos não restaurados, frequentemente considerados impróprios por antropólogos, etnólogos e curadores.
Attia tem interesse especial na noção de reparação, conceito que vem desenvolvendo em sua obra. A reparação é entendida por ele como um processo de aperfeiçoamento e cicatrização, seja das instituições ou das tradições, dos sujeitos ou dos objetos, algo que pode estar ligado às perdas ou às feridas, à recuperação ou à reapropriação. Enquanto a noção de reparo no Ocidente tenta retornar os objetos a um estado e a uma ordem originais, buscando uma perfeição e estética idealizadas, as imagens de objetos africanos que Attia selecionou mostram um outro tipo de reparo, incorporando materiais inusitados como botões e pedaços de espelhos. Lado a lado, estas imagens dos veteranos de guerra e das esculturas reparadas apontam para as conexões entre a guerra e a reparação, a violência colonial e a estética, as marcas no corpo e nos objetos.
Ao longo de 2018, os vídeos aqui apresentados integram o ciclo Histórias Afro-atlânticas do MASP. De diferentes nacionalidades, gerações e origens, os artistas que participam desse programa são: Ayrson Heráclito, John Akomfrah, Kahlil Joseph, Kader Attia, Catarina Simão, Jenn Nkiru e Akosua Adoma Owusu.
CURADORIA Horrana de Kássia Santoz, assistente de mediação e programas públicos, MASP.