Eliseu Visconti estudou na Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro e, como muitos artistas de sua geração, mudou-se para Paris a fim de aprimorar sua pintura na famosa Académie Julian. Na Europa, expôs
obras em diversos salões, como os de Paris e Munique, em 1896, onde apresentou
A convalescente. Na pintura, vemos a personagem desfalecida sendo cuidada por um homem, que parece lhe dar um beijo carinhosamente. Há uma impressão de movimento na cena, tanto pela maneira como ele se reclina quanto pelo modo como
uma criada entra em cena. As mãos da jovem seguram os braços da poltrona de forma expressiva, enquanto o peso de seu corpo se desfaz com languidez. A imagem construída pelo artista segue uma visão romântica do
feminino, com a mulher frágil. Tal como Visconti, outros artistas da época também trabalharam com o tema, e as convalescentes normalmente eram representadas com vestidos brancos, repousando recostadas em
travesseiros. Na pintura de Visconti, a cortina avermelhada de voal filtra com delicadeza a luz que vem de fora e confere tons rosados ao ambiente, refletidos nas faces do casal. O artista imprime um brilho especial
ao branco do vestido e do avental, alternando a sombra rosada com pinceladas sutilmente azuladas. As transparências e sombreados são tratados com extrema leveza por Visconti, cujo uso preciso das cores e da
luminosidade parece ter sofrido influência das pinturas do impressionismo, com as quais o artista teve contato no período em que esteve na França.
Por Giancarlo Hannud
A carreira de Eliseu Visconti (1866-1944) teve início ainda nos últimos anos do império, sob forte influência dos grandes mestres da Academia de Belas Artes, e prolongou-se até sua morte. Sua vasta produção nos
revela um espírito artístico irrequieto, interessado nas possibilidades expressivas abertas por movimentos então pouco discutidos pelo ambiente local, como o pré-rafaelismo, o divisionismo e o simbolismo. Respeitado
por seus contemporâneos mais tradicionalistas e pelos inovadores, foi encarregado de importantes encomendas como o monumental pano de boca do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Se, por um lado, produziu obras
celebratórias do regime de Getúlio Vargas como o
Hino à Bandeira, por outro, deixou vasta produção de caráter menos oficioso, como A convalescentee Nu, ambas do acervo do MASP, e Menina com ventarolae Torso de menina. Nessas imagens de jovens em autocontemplação, de crianças desnudas em torpor e de cenas domésticas paira, por detrás dos tons calmos de sua pintura, a sugestão de algo mais perverso. Produzidas num momento chave da
virada para o século 20, quando os processos mais desconhecidos do funcionamento humano começavam a ser revelados, elas nos abrem uma janela às múltiplas formas assumidas pela violência no período que ficou conhecido
como a
bélle époque, assumindo particular ressonância num país como o Brasil, distante poucos anos da escravidão (abolida em 1888), e que, como foi dito à época, buscava
civilizar-se.