Leda Catunda é muitas vezes associada à Geração 80, coletiva no Rio de Janeiro em 1984 reunindo um grupo de artistas que emergia no final da ditadura brasileira (1964-1985). Um dos motes da
geraçãoera o "prazer da pintura", que se contrapunha ao caráter muito cerebral da arte conceitual dos anos 1970. Ainda que revigorando a pintura de modo irreverente, com referências populares, íntimas e
cotidianas, uma afirmação de Catunda é significativa: "O trabalho pode ter um conteúdo conceitual e ao mesmo tempo pode ser manual e pode ser pintura". Há uma certa estética do precário, do manual e do
popular em sua obra, que se reflete no uso de tecidos não tradicionais como suporte para pintura, muitos vindos da "seção cama mesa e banho"— toalhas, lençóis, flanelas, cobertores, capachos. "Como não
sou a rainha da marcenaria", disse Catunda, "fui costurar".
Poética da maciezé o título de sua tese de doutorado, que explorava elementos não rígidos na arte, numa genealogia que inclui Lucio Fontana (1899-1968), Lygia Clark (1920-1988), Eva Hesse (1936-1970) e Yayoi Kusama. Na obra de
Catunda, tais feições tomam as formas (mais do que apenas os traços) de seres vivos e partes do corpo: línguas, bocas, barrigas, cérebros, fígados e moscas que constituem um
universo de macios. Nesse contexto, Barriga(1993), feita em lona pintada com tinta acrílica e recheada de espuma picada de travesseiro, é uma obra icônica da artista, tendo participado de duas Bienais de São Paulo. A barriga é aquela parte no meio do corpo
que pode incomodar ou trazer conforto, inchar ou doer, estar cheia ou vazia, levar um soco ou carregar um outro. Ela expressa uma interioridade, uma intimidade, uma suscetibilidade, e, sobretudo, uma possibilidade da
pintura como representação e construção de um corpo — macio, afetivo, reconfortante, feito à mão e de todos nós.