Renoir conheceu Claude Monet (1840-1926) ainda na juventude, quando frequentava ateliês e estudava na École des Beaux-Arts de Paris. Com Camille Pissarro (1830-1903) e Alfred Sisley (1839-1899), eles formaram o primeiro núcleo dos impressionistas que renovaram a técnica e os temas da pintura da época. No grupo, Renoir ficou conhecido por suas cenas dos cafés e bares da capital, e por nus femininos. Interessava-se pela representação da figura humana, diferentemente dos outros, mais preocupados em captar a sensação visual produzida pelo motivo ao ar livre. As doze pinturas de Renoir na coleção do MASP cobrem quase toda a carreira do artista, da juventude à velhice. Na obra Menina com as espigas (1888), o pintor aproxima, com uma técnica refinada, o caráter infantil à atmosfera cálida e luminosa do verão europeu, quando o trigo amadurece e é colhido. Apesar do rosto delicado da garota, Renoir alcançou, com o empastado dos tons de verde, a sensação tátil das espigas e da vegetação; é quase possível sentir o movimento dos ramos sob o vento ou a textura do monte que a garota carrega.
— Equipe curatorial MASP
Por Luciano Migliaccio
Para Bardi e Camesasca (1979, pp. 82-83), a modelo seria a pequena Helyone, caçula do poeta Catulle Mendès, retratada por Renoir, junto com a irmã, num outro quadro, datado de 1888 (coleção Arnenberg, Londres). Os estudos realizados por House (1985, pp. 258-259) ressaltam o caráter complexo do quadro, rico em citações e em idéias que revelam novas atitudes do artista. Em 1888, tendo sofrido uma crise de criatividade no ano anterior, Renoir, pressionado pelo marchand Durand-Ruel a abandonar sua meticulosidade “à la Ingres”, retomou a técnica de sua primeira fase, como escreveu ao seu amigo Bérard. Contudo, o quadro do Masp, Menina com as Espigas – Menina com Flores – mostra que não houve exatamente apenas um retorno à maneira anterior, como afirmou Renoir. Camesasca (1989, p. 161) nota na pintura uma melancólica solenidade, revelando uma retomada de Corot e da pintura francesa do século XVIII. House sugere que a obra sofreu influência do Torso de Mulher ao Sol (Paris, Musée d’Orsay), pintado por Renoir em 1875, embora aqui o corpo seja claramente separado do ambiente e não haja o jogo de tons azuis e verdes que reflete na figura as variações da luz da folhagem. A luz difusa do quadro anterior é substituída por uma vibração contínua que não dissolve o corpo na natureza. Este novo papel estrutural da cor deve-se provavelmente à proximidade de Cézanne, a quem Renoir admirava e com quem passou algum tempo trabalhando em Aix-en-Provence entre 1888 e 1889.
— Luciano Migliaccio, 1998