Van Gogh adquiriu interesse pela pintura trabalhando para o marchand Goupi, na Holanda e em Londres. Posteriormente, dedicou-se à carreira religiosa entre os mineiros pobres da Bélgica, até ser demitido por apoiar as lutas dos trabalhadores. Lá, começou a pintar e fez sua primeira obra notável, Os comedores de batatas (1885). No ano seguinte, em Paris, iniciou estudos da técnica impressionista e das estampas japonesas. Em seguida, mudou-se para Arles, no sul da França, onde iniciou uma série de trabalhos de luminosidade esplêndida e cores vibrantes. Nessa época, sofreu transtornos psíquicos e internações compulsórias, que culminaram em seu suicídio em 1890. Suas cartas são documentos fundamentais para a compreensão da obra, especialmente aquelas endereçadas ao irmão Theo van Gogh (1857-1891). O modelo de O escolar (O filho do carteiro — Gamin au Képi) (1888) é, como comprova o estudo das cartas do artista, Camille, o filho do carteiro Joseph Roulin. Vários membros da família Roulin posaram para Van Gogh em Arles. O mesmo fundo amarelo e vermelho foi utilizado em outras obras dessa fase, incluindo seus autorretratos. As cores vibrantes e saturadas deixam as marcas das pinceladas mais evidentes.
— Equipe curatorial MASP, 2017
Por Felipe Martinez
Em dezembro de 1888, Vincent van Gogh escreveu ao irmão, Theo: "fiz os retratos de toda uma família, a família do carteiro, de quem antes eu já havia feito o rosto — o homem, sua esposa, o bebê, o garoto e o filho de 16 anos, todos tipos e bem franceses, embora eles tenham certo ar de russos". O garoto, modelo de O escolar (1888), chamava-se Camille Roulin e era filho de Joseph Roulin, o carteiro de Arles, no sul da França, um dos poucos amigos do pintor na cidade. Diferentemente dos outros dois retratos do menino, a pintura do MASP apresenta um recurso muito utilizado por van Gogh: o contraste simultâneo entre cores complementares, obtidos pela justaposição de cores primárias (amarelo, vermelho e azul) e secundárias (laranja, verde e violeta). Para obter o laranja, por exemplo, é necessário misturar o vermelho com o amarelo. O contraste entre o laranja e o azul, cor que ficou de fora da mistura, é mais intenso do que o contraste entre o laranja e as outras duas cores primárias. O mesmo acontece com os pares verde/vermelho e amarelo/violeta. Em O escolar, o fundo é dividido em duas partes: a metade inferior, laranja, está em contraste com a roupa azul; a metade superior, vermelha, contrasta com o rosto esverdeado do menino. A mesma solução foi utilizada em um autorretrato que van Gogh pintou na mesma época, pouco tempo depois de ter cortado sua orelha, no qual a metade laranja aparece em cima, em contraste com o chapéu azul, e a metade vermelha, embaixo, em contraste com o casaco verde. O uso desse recurso mostra que, mesmo nos momentos de crise aguda, a pintura de van Gogh continuava lúcida.
— Felipe Martinez, doutor em História da Arte, Unicamp, 2021
Por Luciano Migliaccio
Scherjon e De Gruyter datam o quadro O Escolar (O Filho do Carteiro – Gamin au Képi) de 1890 e o relacionam a uma carta de Van Gogh a Theo, escrita em Saint-Rémy, datada de 4 de janeiro daquele ano (n. 622), na qual o artista se refere a um pequeno retrato de um dos empregados do sanatório que ele queria enviar à mãe do garoto. Essa data foi aceita por Lecaldano, Müller e outros autores. Camesasca identifica o modelo como sendo Camille, filho do carteiro Joseph Roulin. Os membros da família Roulin foram os modelos favoritos de Van Gogh durante sua estada em Arles. Assim, esta tela dataria entre novembro e dezembro de 1888, quando o pintor escreveu ao irmão Theo: “Pintei os retratos de toda a família do carteiro... o homem, a mulher, a criança, o menino, o filho de 16 anos, todos característicos e muito franceses, embora o primeiro possua as feições de um russo”. Camesasca nota também que o fundo, dividido em duas faixas, uma amarela e a outra vermelha, aparece invertido apenas no Auto-Retrato com a Orelha Enfaixada e Cachimbo, que é certamente de janeiro de 1889 (Chicago). Pickvance (1984), que também considera o quadro como sendo de 1888, explica a diferença de técnica em relação às outras pinturas da mesma época, pelo fato de o modelo ter sido incapaz de manter a pose.
— Luciano Migliaccio, 1998