Curadoria: Daniela Rodrigues, Supervisora de Mediação e Programas Públicos, MASP
Emilija Škarnulytė (Vilnius, 1987, vive em Vilnius, Lituânia, e Tromsø, Noruega) atua entre o documental e o imaginário, criando filmes e instalações imersivas que exploram o tempo profundo e estruturas invisíveis, em uma espécie de arqueologia do futuro. Bases nucleares e militares, bancos de dados submersos e espaços em transformação compõem suas paisagens. Em alguns trabalhos, figuras mitológicas como a sereia atravessam águas pré-históricas ou pós-humanas; em outros, máquinas constroem cenas distópicas ou de ficção científica. Suas obras refletem as cicatrizes deixadas pela humanidade na Terra, transitando do cósmico e geológico ao ecológico e político.
Em Æqualia (2023), video-instalação de nove minutos, a filmagem ocorre no Encontro das Águas, onde os rios Negro e Solimões correm lado a lado por seis quilômetros, antes de formar o Amazonas, próximo a Manaus. A artista encarna um corpo híbrido, humano e peixe, que nada na confluência de temperaturas e densidades distintas. O Negro, quente e escuro, carrega matéria orgânica da floresta; o Solimões, frio e leitoso, traz sedimentos andinos. A sereia, Æqualia, encontra os botos cor-de-rosa, animais centrais nas cosmologias amazônicas, expandindo a dimensão simbólica do filme, até que a câmera, antes aérea, mergulha nas águas. A trilha sonora mistura sons eletrônicos, da floresta e dos sonares dos botos, em ritmos que oscilam entre calmaria e tensão. Comissionada pela 14ª Bienal de Gwangju e pelo Canal Projects (Nova York), esta obra foi mostrada nos Estados Unidos, no México e agora no Brasil. Meses após as filmagens, uma morte em massa de botos ocorreu, ligada às queimadas na Amazônia e às mudanças climáticas.
Mais do que filmar, Škarnulytė busca transformar-se e estar na escala do lugar, explorando qualidades fenomenais e subjetivas da experiência. Envolve seu corpo, mas também promove a imersão dos espectadores. No MASP, a projeção ocupa integralmente uma das paredes da sala, enquanto as laterais espelham a imagem e incluem o visitante na paisagem. A artista transcende a grandiosidade da natureza ao refletir sobre conflitos humanos diante do desconhecido, dos mitos e da crise ambiental, somando encantamento estético à consciência da ameaça.
Legenda: Emilija Škarnulytė, Æqualia [still], 2023.
SOBRE A ARTISTA
Emilija Škarnulytė apresentou trabalhos no MoMA PS1, Palais de Tokyo, Louisiana MoMA, Villa Medici, MORI Art Museum, Kiasma, Bienal de Gwangju, Bienal de Helsinque e Penumbra. Suas exposições individuais incluem: Kunsthall Trondheim (2024), Canal Projects, Nova York (2024), Kunsthaus Göttingen (2024), Ferme-Asile, Sion (2023), Kunsthaus Pasquart, Biel/Bienne (2021), Den Frie, Copenhague (2021), Galeria Nacional de Vilnius (2021), Künstlerhaus Bethanien, Berlim (2017) e o Contemporary Art Centre CAC de Vilnius (2015). Uma próxima exposição será apresentada na Tate St Ives, em outubro de 2025. Ela recebeu prêmios como o Ars Fennica Award (2023) e o Future Generation Art Prize (2019). Representou a Lituânia na XXII Trienal de Milão e participou do Pavilhão Báltico na Bienal de Arquitetura de Veneza de 2018. Seus filmes integram coleções do Centre Pompidou, Kadist Foundation, Kiasma, Fondazione in Between Art and Film, IFA, HAM, FRAC Córsega, LNMA, MO Museum, além de coleções particulares. Ela é fundadora e atualmente co-dirige o Polar Film Lab, coletivo dedicado à prática do cinema analógico em Tromsø, Noruega, e integra a dupla artística New Mineral Collective.