PROGRAMA
10.12.2025
Quarta-feira
11H
INTRODUÇÃO
Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP
Kaira Cabañas, diretora associada de Programas Acadêmicos e Publicações no Center for Advanced Study in the Visual Arts na National Gallery of Art, Washington, DC
11H10–13H
Mesa-redonda
ELIELTON RIBEIRO
Aurora Cursino dos Santos: Quando a noite desce
Aurora Cursino dos Santos (1896-1959) é uma artista que esteve internada como paciente do Hospital Psiquiátrico do Juquery, no qual produziu diversas pinturas. Construiu um conjunto consistente de obras que apresentam paisagens noturnas. Há indícios de sua trajetória de vida, relatos da prostituição e do tratamento que recebeu no hospital psiquiátrico. A escrita foi estilisticamente inserida em suas produções pictóricas e acompanha imagens de denúncia, violências, desejos, memórias e delírios. Frente e verso confundem-se em muitas obras, pois a artista criou nos dois lados do mesmo suporte. Quando há verso, evidencia os materiais reutilizados para reinventar a vida.
INGRID VON BEYME
Else Blankenhorn: Uma fantástica moeda imperial
No sanatório particular de Bellevue, Else Blankenhorn (1873-1920) escolheu o Imperador Guilherme II como seu “marido espiritual”. Em nome dele, Blankenhorn criou cédulas de dinheiro em quantias fantásticas para financiar a escavação e a ressurreição de amantes falecidos. Além disso, sua obra apresenta representações simbólicas e temas naturais, arquitetônicos e religiosos, cujo significado é difícil de ser decifrado. Blankenhorn é a única mulher a quem Hans Prinzhorn originalmente pretendia dedicar um capítulo em seu seminal livro Artistry of the Mentally Ill (1922). Por motivos de espaço, ele teve de reduzir o capítulo e, em seu lugar, planejou uma monografia, que nunca foi escrita.
BART MARIUS
A baronesa Lucy Szaak: Arte como memória
Lucy Szaak foi paciente em um asilo para mulheres, localizado nos arredores da cidade belga de Gante. Quando conheceu Dirk Pauwels (terapeuta criativo), ela passou a trabalhar com base em suas memórias de aristocrata. No mundo de Szaak, grandes festas que tinham os Beatles como convidados especiais eram realizadas em sua cidade natal, na Hungria. Seu mundo colorido funciona como uma janela para suas fantasias e seus desejos. As obras de Szaak foram apresentadas ao público pela primeira vez na década de 1970, como parte de uma exposição em uma pequena galeria próxima a Gante. Essa exposição foi a primeira vez em que foi mostrado o trabalho de uma artista desse ateliê de expressão criativa, constituindo assim um precedente menos conhecido da apresentação de pacientes de um asilo como artistas. Desde 2022, essas obras fazem parte de uma coleção mais ampla do Museum Dr. Guislain.
Mediação: Isabella Rjeille, MASP
13H–14H30
INTERVALO
14H30–15H30
Mesa-redonda
GLAUCIA VILLAS BÔAS
Um acontecimento incomum: os concretistas do Ateliê do Engenho de Dentro
Ao provocar a suspensão do familiar, a arte e a loucura nos surpreendem. Nenhuma delas se deixa reduzir a categorias ou a conceitos. Por isso, refletir sobre os sentidos das relações entre ambas é uma tarefa delicada. Nesta apresentação, exploro as conexões entre o surgimento da arte abstrata concreta na cidade do Rio de Janeiro e o Ateliê do Engenho de Dentro, do Hospital Psiquiátrico Pedro II. Procuro rastrear um acontecimento incomum, que ocorreu de 1946 a 1951, iluminando os laços que se estabeleceram entre pacientes esquizofrênicos do hospital, jovens artistas em início de carreira, o trabalho da médica Nise da Silveira (1905-1999) e as intervenções do crítico de arte Mário Pedrosa (1900-1981). Ao final, mostro o papel dessa sociabilidade sui generis no surgimento do concretismo no Rio de Janeiro.
RAPHAEL KOENIG
“Um lugar sem razão”: O poeta surrealista Paul Éluard no Hospital Saint-Alban
A loucura, como tema e tropo estético, é onipresente nas produções do movimento surrealista francês. No entanto, são relativamente raras as interações reais de seus membros com pacientes de instituições psiquiátricas. Esta apresentação discutirá a temporada que o poeta francês Paul Éluard (1895-1952) passou no Hospital Saint-Alban, na França ocupada (de novembro de 1943 a fevereiro de 1944), como um importante ponto de inflexão nos discursos surrealistas sobre loucura e saúde mental. Éluard compartilhou a vida cotidiana dos pacientes, participou de debates com a equipe médica sobre cuidados psiquiátricos e divulgou, a partir do hospital, poemas clandestinos antinazistas e outras obras literárias relacionadas.
Mediação: Yudi Rafael, MASP
15H30 – 16H30
Conferência
JAVIER TÉLLEZ
O navio dos loucos
Um limite não é aquilo em que algo para, mas, como escreveu Heidegger, o limite é aquilo em que algo inicia sua “presentificação”. Ao analisar a relação entre os limites físicos e a construção histórica da ideia de loucura na cultura ocidental, comentarei sobre algumas obras – recentes e nem tanto – nas quais explorei uma “presentificação” específica que pode ocorrer em espaços limítrofes produzidos por noções construídas de doença mental. Por meio do uso da imagem do stultifera navis (o navio dos loucos), ampliarei a análise sobre vários projetos que buscam circular livremente em um espaço intermediário, no qual hierarquias como sentido e absurdo, centro e margem, normalidade e patologia não mais são entidades estáveis.
Mediação: Kaira Cabañas, diretora associada de Programas Acadêmicos e Publicações no Center for Advanced Study in the Visual Arts na National Gallery of Art, Washington, DC
11.12.2025
Quinta-feira
11H-13H
Mesa-redonda
IBÃ HUNI KUIN
Nixi Pae: A miração como caminho de cura e memória entre os Huni Kuin
Para falar sobre miração, os povos Huni Kuin comungam o Nixi Pae, sua bebida sagrada. É sob efeito dessa bebida que se inicia a experiência da miração. Na língua Huni Kuin, “mirar” é olhar e entender o que pode acontecer com si mesmo no futuro. A miração ensina o que é preciso para compreender a vida e sentir alegria. É uma aprendizagem com o espírito, com a força da floresta que vive dentro de você. O espírito fala, ensina pela música, pela visão. Nessa força, você muda – deixa de ser apenas pessoa e se torna parte do espírito. É uma viagem interior, na qual o corpo descansa e o pensamento caminha. A miração traz luz, conhecimento e alegria para o coração.
ADANA OMÁGUA KAMBEBA
Visões da floresta: loucura, delírio e cura na perspectiva indígena
Esta comunicação apresenta, sob a ótica indígena, uma reflexão sobre loucura, delírio e cura em diálogo com a arte e com a psiquiatria ocidental. Para os povos da floresta, nem sempre o delírio significa ruptura com a razão, mas pode ser um chamado do espírito; uma possível maneira de comunicação com o invisível e com a Mãe Terra. A arte indígena se expressa em cantos, pinturas e rituais, atuando como uma tradução simbólica dessas visões e integrando corpo, espírito e comunidade em processos dialogais. Propõe-se decolonizar o conceito de sanidade, reconhecendo que podem existir diferentes modos de perceber o mundo, que revelam saberes legítimos e necessários à saúde coletiva. Serão apresentadas reflexões convidativas que buscam inspirar e fazer perceber novas redes de cuidado, nas quais a escuta, o sonho e o sentimento de pertencimento sejam caminhos para a cura individual e planetária.
Mediação: Guilherme Giufrida, MASP.
13H—14H30
Intervalo
14H30—16H30
Mesa-redonda
EURÍPEDES JUNIOR e CLAUDIA BOLSHAW
A teia da aranha e a casa da abelha: Fernando Diniz, o demiurgo
Nos últimos anos de vida, Fernando Diniz, artista do Museu de Imagens do Inconsciente (MII), produziu mais de 80 mil desenhos que serviram de base para seu premiado filme Estrêla de oito pontas (1996; 12 minutos), produzido em colaboração com o cineasta Marcos Magalhães. A estrela, para Diniz, é um sistema gráfico que organiza o espaço e do qual surgem todas as suas figuras. É um filme que também reproduz a fala deste artista negro, que vivenciou o racismo e a internação psiquiátrica por 45 anos. Seja no figurativo ou na abstração, na pintura, no desenho, na modelagem ou no filme, ele investiga de maneira incessante as propriedades das formas e das cores, das linhas e dos volumes em um jorro contínuo, como a reproduzir a atividade do Universo.
ALASSANE SECK e ABDOULAYE ARMIN KANE
Das palavras à expressão
Esta apresentação se concentrará em uma forma de tratamento no Atelier d’Expression Artististique da Clinique Psychiatrique Moussa Diop, no Hospital FANN em Dacar, Senegal. Essa abordagem é totalmente inspirada o método terapêutico da gloriosa Faculdade de Psiquiatria de Dacar. De fato, uma das principais realizações dessa histórica faculdade africana – preservada até a atualidade – é o famoso PENC. Este era um local de diálogo dos antigos povos senegaleses e até mesmo africanos, que nossos famosos psiquiatras da década de 1950 foram capazes de transformar em um espaço terapêutico. Acima de tudo, o Atelier inspira um ambiente de compartilhamento, um clima de liberdade – controlada, é claro – e uma fuga do isolamento social. No filme Atelier d’expression (2016), Friedl Kubelka vom Gröller capta vários artistas do Atelier, um espaço que oferece a muitos pacientes um lugar no qual podem praticar a fala, assim como esboçar e realizar projetos artísticos.
Mediação: Bruna Fernanda, MASP