MASP

Histórias indígenas

29.7.2020
QUARTA
ONLINE
11H-15H30
Este é o terceiro seminário de um projeto de longo prazo que antecipa o programa de exposições, palestras, oficinas, publicações e cursos no MASP dedicado às Histórias indígenas em 2023.

O primeiro seminário ocorreu em junho de 2017 e contou com a participação de Ailton Krenak, Aristóteles Barcelos Neto, Claudia Andujar, Davi Kopenawa, Edson Kayapó, Els Lagrou, Joseca Yanomami, Luís Donisete Benzi Grupioni, Luisa Elvira Belaunde, Lux Vidal, Milton Guran e Pedro de Niemeyer Cesarino. O segundo seminário foi realizado em julho de 2019 e contou com a presença de Biung Ismahasan, Brook Andrew, Daiara Tukano, Denilson Baniwa, Franchesca Cubillo, Heather Ahtone, Moara Brasil, Nigel Borell, Sandra Benites, Sarah Ligner, Scott Manning Stevens e Ticio Escobar.

Os seminários reintroduzem as culturas indígenas no museu. Ao longo de sua história, o MASP organizou diversas exposições com objetos e registros de comunidades indígenas localizadas no território brasileiro, como: Exposição de arte indígena (1949), Alguns índios (1983), Arte karajá (1984), Índios Yanomami (1985) e Arte indígena kaxinawa (1987).

Com a presença de teóricos, artistas e curadores de diferentes locais, cenários e perspectivas, os seminários também se propõem a apresentar e discutir a riqueza e a complexidade de materiais indígenas e culturas imateriais, suas filosofias e cosmologias, além dos desafios e das possibilidades de trabalhar com esses campos, sobretudo no contexto de um museu. 

TRANSMISSÃO AO VIVO 
O seminário terá transmissão online e gratuita através do perfil do MASP no YouTube, com tradução em libras.

FOLDER
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ORGANIZAÇÃO
Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP
André Mesquita, curador, MASP
Guilherme Giufrida, assistente curatorial, MASP
Lilia Moritz Schwarcz, curadora adjunta de histórias, MASP
Sandra Benites, curadora adjunta de arte brasileira, MASP

PROGRAMA

11H-11H10
introdução
LILIA MORITZ SCHWARCZ, curadora adjunta de histórias, MASP

11H10-12H40
ARIEL KUARAY ORTEGA

O cinema e os Guarani: espiritualidade, territórios e fronteiras
O cinema entre os Guarani, especialmente na aldeia onde vive Ariel, tem hoje uma importância política e espiritual. Interessa, para ele, pensar o significado do cinema para os Guarani e quais mudanças ele causou para esse povo que vive em uma situação de fronteira, entre Brasil, Paraguai e Argentina. O cinema é uma ferramenta que permite que os indígenas transmitam suas histórias. Ao mesmo tempo, o cinema indígena teve que transformar tal ferramenta ocidental para que ela pudesse ser aceita dentro da aldeia. Em diálogo com a comunidade, vídeos registram a cultura Guarani em seus próprios termos e tempos. Apesar de ser uma linguagem universal com certas regras, o cinema, quando entra na aldeia, funciona no ritmo dela, impondo um confronto constante e produtivo entre dois mundos.

ROSAURA ANDAZABAL 
O projeto Cuentos Pintados del Perú [Contos Pintados do Peru] e sua contribuição para a educação intercultural e bilíngue 
Criado e dirigido de 1994 até janeiro de 2020 pelo historiador peruano Pablo Macera, o projeto influenciou no fomento e desenvolvimento da educação intercultural e bilíngue. Projeto este que, no decorrer do que hoje são quase três décadas, compilou diversos registros plásticos que andam de mãos dadas com a oralidade própria de mulheres e homens migrantes dos Andes e da Amazônia peruana, estabelecidos com suas famílias na urbe metropolitana de Lima. Um patrimônio cultural que se tornou tangível por meio de publicações (contos, catálogos, calendários e outros itens em idioma nativo e em espanhol), exposições de arte, celebrações rituais de festas tradicionais e participações em eventos culturais de nível nacional e internacional. Obras de artistas populares que, segundo os dizeres do próprio Pablo Macera, “constroem um espaço próprio e obtêm, com certas limitações, um reconhecimento justo dentro e fora desse Quarto Mundo que opera dentro do Terceiro Mundo”.

CARLOS FAUSTO
A face de Deus e a face do jaguar: a arte indígena para além do humano

“Então disse Deus: – Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança.” Esse famoso versículo está na origem de toda uma tradição imagética ocidental, cujos pilares são o antropomorfismo e a verossimilhança. Contudo, nem todas as sociedades do mundo estabeleceram essa surpreendente correspondência entre o humano e o divino. As sociedades indígenas das Américas, que floresceram durante treze milênios ao largo da cultura cristã, não imaginaram nem materializaram o divino na forma humana. Ao contrário, suas artes procuram figurar as “divindades” por meio de imagens paradoxais, forjadas em um vigoroso zoomorfismo e um antropomorfismo apenas latente. Nessa apresentação, Carlos convida os ouvintes a “estranharem” sua própria tradição artística, bem como suas premissas antropocêntricas, por meio de uma viagem pelas artes indígenas.

Mediação: Guilherme Giufrida, assistente curatorial, MASP


14H-15H30
ABRAHAM CRUZVILLEGAS
Histórias indigentes

Entendendo “indígena” como uma categoria política, e não apenas cultural, além de considerar a língua como território, conforme proposto por Yásnaya A. Gil, Abraham irá falar sobre o projeto atual do Exército Zapatista, a Universidad de la Tierra, por meio do qual se confirma a transformação em projeto cultural do que era antes uma organização militar criada pelos povos indígenas de Chiapas para lutar contra o Estado mexicano. Será abordado o povo P’urhépecha do povoado de Cherán, em Michoacán, que – depois de sofrer com a presença dos cartéis de drogas, a devastação de seu ambiente e a decorrente destruição de suas economias, tradições e culturas – decidiu se organizar em “autodefesas” para se livrar de um ambiente corrompido e se declarar autônomo em relação ao estado federal, recuperando assim seu sistema de governo tradicional, independente e não ocidental. A família do pai de Abraham também é de origem P’urhépecha de Nahuatzen, vilarejo próximo a Cherán, enquanto sua mãe tem origens Hñähñu. Ele é um artista que se questiona sobre a construção da identidade do sujeito dentro de um modelo ou metodologia não binário – quiçá trinitário ou múltiplo, simultâneo: um modelo contraditório e ineficiente.

SANDRA GAMARRA
Se me sale el indio

Enquanto artista e antropólogo, ou como artista antropólogo, José María Arguedas é uma das vozes mais necessárias e importantes da cultura peruana. Ele soube, a partir de sua condição de mestiço, falar enquanto índio e enquanto ocidental, entendendo a mestiçagem não como a dissolução de uma cultura na outra, e sim como uma convivência complexa, dolorosa e bastante particular, dependendo das circunstâncias de cada grupo. As ferramentas usadas por ele para navegar nessas águas são justamente a escrita e uma antropologia subversiva. Falar em histórias indígenas quando a história que fala não é nativa pode parecer uma usurpação da voz e do imaginário desses povos. Todavia, pensando a partir de Arguedas, essas partes se encontram em convívio, e tomar a voz indígena não significa torná-la particular, e sim, pelo contrário, expor essa ficção e, assim, também sua existência. Nesse cenário, a singularidade não é mais uma qualidade, o artista passa a ser mediador da comunidade, um agente que espera que, no uso dessas formas, se manifeste seu significado.

SEBASTIÁN CALFUQUEO ALISTE
Corpos em resistência / Iñche tá kangechi [Eu sou o outro]

A performance Corpos em resistência / Iñche tá kangechi [Eu sou o outro] compila, a partir de relatos coloniais, diversas formas de denominar a sodomia em mapudungun, língua do povo Mapuche. Na mise-en-scène da performance, Sebastián analisa a colonização e a evangelização como práticas de normalização e extermínio de identidades não heterossexuais presentes antes do processo colonial europeu. A obra trabalha com o corpo, a resistência, a cor azul, o som e a relação do cabelo na cosmovisão mapuche, tensionando imaginários coloniais de gênero construídos pelo Ocidente. No capuz utilizado durante a ação, há o desenho de uma Guñelve, estrela que representa Vênus ou o astro do amanhecer, símbolo da resistência mapuche.

Mediação: Devika Singh, curadora, Tate

PALESTRANTES

ABRAHAM CRUZVILLEGAS
Professor na École Nationale Supérieure des Beaux-Arts de Paris. Suas obras participaram de bienais como: Bienal de Honolulu, EUA (2019); Bienal de Sydney, Austrália (2018); Bienal da Nicarágua (2016); 12a Bienal de Sharjah, Emirados Árabes Unidos (2015); dOCUMENTA13 em Kassel, Alemanha (2012); 12a Bienal de Istambul, Turquia (2011); 6a Bienal Mediacity Seul, Coreia do Sul (2010); 10a Bienal de Havana, Cuba (2009); 50a Bienal de Veneza, Itália (2003), entre outros eventos. Em 2016, a Harvard University Press publicou The logic of disorder: the art and writing of Abraham Cruzvillegas, uma coletânea de seus escritos editada por Robin Greely. 

ARIEL KUARAY ORTEGA
Cineasta indígena da etnia Mbyá-Guarani. Atualmente mora na Aldeia Ko’enju, em São Miguel das Missões (RS). Integra o Coletivo Mbyá-Guarani de Cinema, que foi criado em 2007 durante a primeira oficina de vídeo realizada nesse contexto. Atuou como co-diretor dos seguintes filmes: Duas aldeias < uma caminhada (2008); As bicicletas de Nhanderu (2011); Desterro Guarani (2011); Tava, a casa de pedra (2012) e No caminho com Mario (2014). Atualmente, finaliza o filme Canuto, seu primeiro longa de ficção co-dirigido com Ernesto de Carvalho.

CARLOS FAUSTO
Professor do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, pesquisador do CNPq e Global Scholar da Universidade de Princeton. É autor, entre outros, de Inimigos fiéis: história, guerra e xamanismo na Amazônia (2001) e Art effects: agency, image and ritual in Amazonia (2020). É também fotógrafo e documentarista, tendo co-dirigido o filme As hiper mulheres (2011).

ROSAURA ANDAZABAL
Bacharel e licenciada em História e Ciências Sociais pela Universidad Nacional Federico Villarreal, e mestre em História pela Pontificia Universidad Católica del Perú. Desde 1985, trabalha como pesquisadora permanente do Instituto Seminario de Historia Rural Andina (ISHRA), onde também participou ativamente de diversos projetos. Seus estudos se voltaram para a história socioeconômica do Peru e da América Latina entre os séculos XVI e XVIII, arte peruana e educação intercultural e bilíngue nos Andes peruanos. Publicou livros e artigos tanto pelo selo do ISHRA quanto por outras instituições nacionais e internacionais. Desde 1990, coordena o departamento andino do projeto Contos Pintados do Peru.

SANDRA GAMARRA
Estudou Artes Plásticas na Universidad Católica del Perú. No ano de 2002, criou o LiMac, um museu verdadeiro/falso em resposta ao vazio institucional do Peru. Com uma coleção composta a princípio por suvenires – borrachas, lápis, ioiôs –, Gamarra continuará desenvolvendo a coleção do museu com suas apropriações pintadas, além do projeto arquitetônico de um edifício invisível construído sob o deserto de Lima. O uso constante da pintura na obra de Gamarra serve como um espelho que altera os formatos expositivos, suas narrativas e a propriedade intrínseca da cultura.

SEBASTIÁN CALFUQUEO ALISTE
Doutorx em Artes Visuais pela Universidad de Chile. Integra o coletivo feminista mapuche Rangiñtulewfü. É representadx pela Patricia Ready Gallery. De origem mapuche, seu trabalho recorre à sua herança cultural para propor uma reflexão crítica sobre o status social, cultural e político dx sujeitx Mapuche na sociedade contemporânea chilena e latino-americana. Seu trabalho passa por instalação, cerâmica, performance e videoarte para explorar as semelhanças e diferenças culturais, bem como os estereótipos produzidos pelo cruzamento dos modos de pensar indígena e ocidental.
 

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