11H-11H10
introdução
LILIA MORITZ SCHWARCZ, curadora adjunta de histórias, MASP
11H10-12H40
ARIEL KUARAY ORTEGA
O cinema e os Guarani: espiritualidade, territórios e fronteiras
O cinema entre os Guarani, especialmente na aldeia onde vive Ariel, tem hoje uma importância política e espiritual. Interessa, para ele, pensar o significado do cinema para os Guarani e quais mudanças ele causou para esse povo que vive em uma situação de fronteira, entre Brasil, Paraguai e Argentina. O cinema é uma ferramenta que permite que os indígenas transmitam suas histórias. Ao mesmo tempo, o cinema indígena teve que transformar tal ferramenta ocidental para que ela pudesse ser aceita dentro da aldeia. Em diálogo com a comunidade, vídeos registram a cultura Guarani em seus próprios termos e tempos. Apesar de ser uma linguagem universal com certas regras, o cinema, quando entra na aldeia, funciona no ritmo dela, impondo um confronto constante e produtivo entre dois mundos.
ROSAURA ANDAZABAL
O projeto Cuentos Pintados del Perú [Contos Pintados do Peru] e sua contribuição para a educação intercultural e bilíngue
Criado e dirigido de 1994 até janeiro de 2020 pelo historiador peruano Pablo Macera, o projeto influenciou no fomento e desenvolvimento da educação intercultural e bilíngue. Projeto este que, no decorrer do que hoje são quase três décadas, compilou diversos registros plásticos que andam de mãos dadas com a oralidade própria de mulheres e homens migrantes dos Andes e da Amazônia peruana, estabelecidos com suas famílias na urbe metropolitana de Lima. Um patrimônio cultural que se tornou tangível por meio de publicações (contos, catálogos, calendários e outros itens em idioma nativo e em espanhol), exposições de arte, celebrações rituais de festas tradicionais e participações em eventos culturais de nível nacional e internacional. Obras de artistas populares que, segundo os dizeres do próprio Pablo Macera, “constroem um espaço próprio e obtêm, com certas limitações, um reconhecimento justo dentro e fora desse Quarto Mundo que opera dentro do Terceiro Mundo”.
CARLOS FAUSTO
A face de Deus e a face do jaguar: a arte indígena para além do humano
“Então disse Deus: – Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança.” Esse famoso versículo está na origem de toda uma tradição imagética ocidental, cujos pilares são o antropomorfismo e a verossimilhança. Contudo, nem todas as sociedades do mundo estabeleceram essa surpreendente correspondência entre o humano e o divino. As sociedades indígenas das Américas, que floresceram durante treze milênios ao largo da cultura cristã, não imaginaram nem materializaram o divino na forma humana. Ao contrário, suas artes procuram figurar as “divindades” por meio de imagens paradoxais, forjadas em um vigoroso zoomorfismo e um antropomorfismo apenas latente. Nessa apresentação, Carlos convida os ouvintes a “estranharem” sua própria tradição artística, bem como suas premissas antropocêntricas, por meio de uma viagem pelas artes indígenas.
Mediação: Guilherme Giufrida, assistente curatorial, MASP
14H-15H30
ABRAHAM CRUZVILLEGAS
Histórias indigentes
Entendendo “indígena” como uma categoria política, e não apenas cultural, além de considerar a língua como território, conforme proposto por Yásnaya A. Gil, Abraham irá falar sobre o projeto atual do Exército Zapatista, a Universidad de la Tierra, por meio do qual se confirma a transformação em projeto cultural do que era antes uma organização militar criada pelos povos indígenas de Chiapas para lutar contra o Estado mexicano. Será abordado o povo P’urhépecha do povoado de Cherán, em Michoacán, que – depois de sofrer com a presença dos cartéis de drogas, a devastação de seu ambiente e a decorrente destruição de suas economias, tradições e culturas – decidiu se organizar em “autodefesas” para se livrar de um ambiente corrompido e se declarar autônomo em relação ao estado federal, recuperando assim seu sistema de governo tradicional, independente e não ocidental. A família do pai de Abraham também é de origem P’urhépecha de Nahuatzen, vilarejo próximo a Cherán, enquanto sua mãe tem origens Hñähñu. Ele é um artista que se questiona sobre a construção da identidade do sujeito dentro de um modelo ou metodologia não binário – quiçá trinitário ou múltiplo, simultâneo: um modelo contraditório e ineficiente.
SANDRA GAMARRA
Se me sale el indio
Enquanto artista e antropólogo, ou como artista antropólogo, José María Arguedas é uma das vozes mais necessárias e importantes da cultura peruana. Ele soube, a partir de sua condição de mestiço, falar enquanto índio e enquanto ocidental, entendendo a mestiçagem não como a dissolução de uma cultura na outra, e sim como uma convivência complexa, dolorosa e bastante particular, dependendo das circunstâncias de cada grupo. As ferramentas usadas por ele para navegar nessas águas são justamente a escrita e uma antropologia subversiva. Falar em histórias indígenas quando a história que fala não é nativa pode parecer uma usurpação da voz e do imaginário desses povos. Todavia, pensando a partir de Arguedas, essas partes se encontram em convívio, e tomar a voz indígena não significa torná-la particular, e sim, pelo contrário, expor essa ficção e, assim, também sua existência. Nesse cenário, a singularidade não é mais uma qualidade, o artista passa a ser mediador da comunidade, um agente que espera que, no uso dessas formas, se manifeste seu significado.
SEBASTIÁN CALFUQUEO ALISTE
Corpos em resistência / Iñche tá kangechi [Eu sou o outro]
A performance Corpos em resistência / Iñche tá kangechi [Eu sou o outro] compila, a partir de relatos coloniais, diversas formas de denominar a sodomia em mapudungun, língua do povo Mapuche. Na mise-en-scène da performance, Sebastián analisa a colonização e a evangelização como práticas de normalização e extermínio de identidades não heterossexuais presentes antes do processo colonial europeu. A obra trabalha com o corpo, a resistência, a cor azul, o som e a relação do cabelo na cosmovisão mapuche, tensionando imaginários coloniais de gênero construídos pelo Ocidente. No capuz utilizado durante a ação, há o desenho de uma Guñelve, estrela que representa Vênus ou o astro do amanhecer, símbolo da resistência mapuche.
Mediação: Devika Singh, curadora, Tate