O MASP – Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand apresenta, a partir de 11 de abril, a exposição Hulda Guzmán: frutas milagrosas, primeira mostra individual da artista dominicana Hulda Guzmán (Santo Domingo, República Dominicana, 1984) em um museu.
Em suas telas, a artista subverte a tradição da pintura de paisagem ao negar sua representação exótica e idílica, escolhendo, ao contrário, tratar a natureza como um território protagonista no qual todos os elementos encontram-se em relações de interdependência. Relações de afeto e os arredores do lugar onde vive são temas recorrentes em suas telas, em que cenários tropicais e fantásticos são habitados por um elenco diverso de personagens — reais ou imaginários. Suas obras mantêm um caráter biográfico, impregnado de humor e de um apelo onírico ou teatral.
No trabalho de Guzmán, cenas nas quais humanidade, arquitetura e natureza convivem em equilíbrio e harmonia celebram o meio ambiente ao mesmo tempo que nos convidam a refletir sobre questões urgentes, como a crise climática e a responsabilidade humana na preservação do planeta. “Esta exposição aborda a interconexão do mundo natural com a vida coletiva e o senso de comunidade. Nossa dissociação da natureza é a principal causa do colapso climático e ecológico", diz a artista.
Com curadoria de Amanda Carneiro, curadora, MASP, a mostra tem como ponto de partida a tela Come Dance—Asked Nature Kindly [Venha dançar—convidou a natureza gentilmente], incorporada ao acervo do MASP em 2020, no contexto do ciclo curatorial dedicado às Histórias da dança. A pintura retrata uma grande festa em meio a uma densa e vibrante floresta tropical, na qual figuras humanas interagem de diversas formas: a artista abraça uma árvore, uma criança repousa ao lado de um cachorro, pessoas dançam, se banham e se beijam. O título da obra reforça a reciprocidade, pois a dança não se limita à alegria do movimento, é também uma coreografia de interdependência, um gesto que evidencia que a vida na Terra não pode prosperar no isolamento ou na dominação. Além deste trabalho, a exposição também apresenta outras 17 pinturas, entre as quais 8 são obras inéditas confeccionadas especialmente para a ocasião.
Afora as paisagens tropicais, a artista também produz autorretratos, estabelecendo um diálogo direto com os ambientes ao seu redor. Embora esse caráter autobiográfico seja muito presente em seu trabalho, suas telas também incorporam um amplo repertório de referências da história da arte, como a arquitetura e o mobiliário modernista, o surrealismo, o minimalismo na pintura chinesa antiga e os ex-votos mexicanos.
“O trabalho de Guzmán é muitas vezes uma combinação de observação direta e colagem de figuras e personagens, compondo cenas que transitam entre o íntimo e o inesperado. Em seus quadros, familiares, amigos e animais dividem espaço com personagens que ela garimpa em fontes diversas, como pinturas de diferentes autorias, fotos ou vídeos encontrados em redes sociais”, afirma Amanda Carneiro.
Ricas em detalhes, texturas e cores, as pinturas de Guzmán convidam o público a uma observação atenta, revelando múltiplas camadas visuais e narrativas. A paisagem, protagonista monumental de sua obra, abriga cenas de interações entre diversos personagens ligadas aos prazeres, à sociabilidade e à alegria, evidenciando a indissociabilidade entre vida humana e natureza. Assim, o ambiente natural emerge simultaneamente como cena e cenário, ampliando as possibilidades de leitura desse gênero da pintura na contemporaneidade.
Hulda Guzmán: frutas milagrosas integra a programação anual do MASP dedicada às Histórias da ecologia. A programação do ano também inclui mostras de Mulheres Atingidas por Barragens, Claude Monet, Frans Krajcberg, Clarissa Tossin, Abel Rodríguez, Minerva Cuevas e a grande coletiva Histórias da ecologia.
SOBRE A ARTISTA
Hulda Guzmán (Santo Domingo, República Dominicana, 1984) estudou belas artes e ilustração na Escuela de Diseño Altos de Chavón, na República Dominicana, e concluiu o bacharelado em artes visuais na Escuela Nacional de Artes Plásticas, na Cidade do México. Já expôs em instituições como Fine Arts Center at Colorado College (Colorado Springs), Denver Art Museum, Art Museum of the Americas (Washington, D.C.), Museo de Arte y Diseño Contemporáneo (San José, Costa Rica), Museo de Arte Moderno (Santo Domingo) e Pérez Art Museum (Miami). Em 2019, integrou o pavilhão da República Dominicana na 58ª Bienal de Veneza.
ACESSIBILIDADE
Todas as exposições temporárias do MASP possuem recursos de acessibilidade, com entrada gratuita para pessoas com deficiência e seu acompanhante. São oferecidas visitas em Libras ou descritivas, além de textos e legendas em fonte ampliada e produções audiovisuais em linguagem fácil – com narração, legendagem e interpretação em Libras que descrevem e comentam os espaços e as obras. Os conteúdos, disponíveis no site e no canal do YouTube do museu, podem ser utilizados por pessoas com deficiência, públicos escolares, professores, pessoas não alfabetizadas e interessados em geral.
CATÁLOGO
Por ocasião da mostra, será publicado um catálogo bilíngue, em inglês e português, reunindo imagens e ensaios comissionados que abordam a trajetória de Hulda Guzmán, resultando na primeira grande publicação sobre sua obra. O livro tem organização editorial de Amanda Carneiro, curadora, MASP, e textos de Carneiro, Tobias Ostrander e Elena González. A edição apresenta mais de 100 imagens, com ampliações que ressaltam tanto detalhes da obra da artista quanto ilustrativas de referências.
REALIZAÇÃO E APOIO
Hulda Guzmán: frutas milagrosas é realizada por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, PROAC ICMS e tem apoio de Lefosse.
SERVIÇO
Hulda Guzmán: frutas milagrosas
Curadoria: Amanda Carneiro, curadora, MASP
11.4 — 24.8.2025
1° subsolo, Edifício Lina Bo Bardi
MASP — Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand
Avenida Paulista, 1578 – Bela Vista, São Paulo, SP 01310-200
Telefone: (11) 3149-5959
Horários: terças grátis, das 10h às 20h (entrada até as 19h); quarta e quinta das 10h às 18h (entrada até as 17h); sexta das 10h às 21h (entrada gratuita das 18h às 20h30); sábado e domingo, das 10h às 18h (entrada até as 17h); fechado às segundas.
Agendamento on-line obrigatório pelo link masp.org.br/ingressos
Ingressos: R$ 75 (entrada); R$ 37 (meia-entrada)
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ASSESSORIA DE IMPRENSA
O MASP conclui o ano dedicado às Histórias da Diversidade LGBTQIA+ apresentando, de 13 de dezembro a 13 de abril de 2025, uma mostra coletiva que ocupa três espaços expositivos do museu. A exposição Histórias LGBTQIA+ reúne mais de 150 obras de arte e centenas de documentos nacionais e internacionais.
O MASP apresenta a mostra Mário de Andrade: duas vidas, com curadoria de Regina Teixeira de Barros, curadora coordenadora, MASP, e assistência de Daniela Rodrigues, assistente curatorial, MASP, a exposição reúne um conjunto de pinturas, desenhos, gravuras, esculturas e fotografias da coleção pessoal do intelectual brasileiro, ativo na primeira metade do século 20, a partir da perspectiva de uma sensibilidade queer. A mostra tem patrocínio da Lefosse e apoio cultural do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP).
Paul Gauguin (1848-1903) é considerado um dos mais importantes artistas modernos surgidos na França no século 19. Sua modernidade reside na negação de um estilo único na pintura e na diversidade de formas e elementos que utilizava. Gauguin renovou a pintura incorporando referências de imagens do “outro”, fora do panorama cultural europeu, com paisagens e personagens do Taiti, a ilha no oceano Pacífico que integra a Polinésia Francesa.
Esta é a primeira exposição a abordar de maneira crítica a problemática relação do artista com esse “outro”. Sua obra, sobretudo no período do Taiti, é uma extraordinária investigação sobre a figura e a cor, assim como é extremamente contemporânea no modo como se apropriou de iconografias de diversas culturas, colocando-as em diálogo com a própria tradição da pintura ocidental. Por outro lado, Gauguin também destacou o “outro” como exótico e primitivo, em um desejo fantasioso pelos “trópicos”, uma visão idílica carregada de ficções e estereótipos e estruturada por uma relação de poder – entre o “outro” e eu. Para tornar essa narrativa mais intrincada, o próprio artista se declarava “primitivo”, “selvagem” e falava de seu “sangue inca”, uma vez que sua mãe era peruana e ele vivera em Lima quando criança. De todo modo, é evidente que suas pinturas erotizam o corpo da mulher indígena, enfatizando uma suposta disponibilidade sexual aos olhos e às tintas do homem branco europeu.
Foi a busca por uma arte mais pura e autêntica, bem como por paraísos supostamente imaculados pela civilização, o que levou Gauguin a deixar a França para se fixar no Taiti, ainda hoje um domínio francês na Polinésia. Ele se mudou para lá em 1891, aos 43 anos, e lá viveu até sua morte, com um intervalo de dois anos em Paris, para onde regressou a fim de expor e vender suas obras. A relação com o outro é sempre dada a partir do “eu”, de si próprio, daí o destaque da mostra nos autorretratos do artista.
Gauguin realizou experimentos radicais com pintura, gravura e escultura, em madeira e cerâmica, sempre em busca de novos métodos artísticos, criando obras fascinantes e sedutoras, e reinventando um passado de maneira profunda—e problemática. Nas últimas décadas, a história da arte vem sendo cada vez mais revisada e questionada, sobretudo no que diz respeito às relações com o “outro”. Assim, esta mostra pretende chamar atenção para o fato de que, para uma “outra” história da arte, que não faz parte da tradição dominante, e a depender de quem enuncia a frase, Gauguin também pode ser entendido como o “outro”.
A exposição integra a programação anual do MASP dedicada às Histórias indígenas. Este ano, a programação também inclui mostras de Carmézia Emiliano, MAHKU, Sheroanawe Hakihiiwe, Melissa Cody, além do comodato MASP Landmann de cerâmicas e metais pré-colombianos e a grande coletiva Histórias indígenas.
Paul Gauguin: o outro e eu é curada por Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP; Fernando Oliva, curador, MASP; Laura Cosendey, curadora assistente, MASP.
O MASP e o Sesc estão corealizando uma exposição panorâmica sobre a obra de Anna Bella Geiger (Rio de Janeiro, 1933), que abordará diversos períodos da trajetória da artista, incluindo trabalhos desde a década de 1950 até os anos 2000. A mostra, que será inaugurada em 28 de novembro de 2019, é intitulada Anna Bella Geiger: Brasil nativo/Brasil alienígena, e toma emprestado o título de uma série importante da artista, de 1977, em que ela aborda questões políticas, sociais e antropológicas.
A exposição Histórias das mulheres apresenta quase cem trabalhos, que datam do século 1 ao 19. Como o título indica, não se trata de uma única história, mas de muitas, narradas por meio de obras feitas por mulheres que viveram no norte da África, nas Américas (antes e depois da colonização), na Ásia, na Europa, na Índia e no território do antigo Império Otomano.
Esta é a primeira grande exposição monográfica dedicada à obra de Djanira da Motta e Silva (Avaré, São Paulo, 1914– Rio de Janeiro, 1979) desde seu falecimento há quarenta anos. Autodidata e de origem trabalhadora, a artista surgiu no cenário da arte brasileira nos anos 1940. Embora tenha trilhado sólida carreira em vida, nas últimas décadas Djanira foi colocada de lado nas narrativas oficiais da história da arte brasileira. Esta mostra busca, portanto, examinar o papel fundamental da artista na formação da visualidade brasileira e reposicioná-la na história da arte do país durante o século 20.
No ano dedicado às histórias afro ‑atlânticas no MASP — as histórias dos fluxos e dos refluxos entre a África e as Américas através do Atlântico —, a exposição de Maria Auxiliadora ( 1935 ‑19 74 ) assume uma urgência. A pintura delicada, precisa e pungente da artista retrata seu cotidiano e sua cultura, atravessando muitos temas afro‑ ‑brasileiros: a capoeira, o samba, a umbanda, o candomblé, os orixás. Maria Auxiliadora representa também o dia a dia de seus familiares e de seus amigos nos subúrbios de São Paulo, especialmente nos bairros da Brasilândia e da Casa Verde. Aqui, podemos pensar no argumento feminista de Carol Hanisch nos anos 19 6 0 : “o pessoal é político”. Num contexto e numa cultura em que, na história da arte, as coleções de museus são dominadas por representações e gostos eurocêntricos, brancos e elitistas, a obra de Maria Auxiliadora ganha o sentido de resistência.
De origem humilde, descendente de escravizados, Maria Auxiliadora inventa um outro modo de pintura, longe dos preceitos acadêmicos e modernistas. Uma técnica singular se tornou sua assinatura: mediante uma mistura de tinta a óleo, massa plástica e mechas do seu cabelo, a artista construía relevos na tela. Seu percurso está longe dos artistas canonizados pela história da arte: passou pelas feiras de artes da praça da República, no centro de São Paulo, e da cidade de Embu das Artes, próxima da capital — lugares de confluência e intercâmbio entre aqueles que não encontravam espaços e oportunidades em museus e em galerias do circuito oficial.
Nesta exposição, as pinturas estão organizadas em sete núcleos, pautados nos grandes temas de Maria Auxiliadora. O núcleo Candomblé, umbanda e orixás é central em sua obra, se nos lembrarmos de que, no Brasil, parte da resistência negra se estruturou por meio dos cultos religiosos de matriz africana. Manifestações populares apresenta as procissões e as festas juninas, a capoeira, o bumba meu boi, o carnaval de rua, o samba, os botecos, os bailes de gafieira. Em Autorretratos, a própria Maria Auxiliadora se coloca nos papéis de artista, em plena atividade, mas também de noiva ou de enferma (aos 39 anos, faleceu em decorrência de um câncer). Em Casais, uma de suas maiores obsessões, o enfoque é o cortejo e a conquista, refletindo, assim, sua perspectiva romântica. Em Rural, reúnem‑se imagens do trabalho e da vida no campo. Urbano traz cenas em parques de diversões, praça, bar, cinema e escola. No núcleo Interiores, o cotidiano é registrado e celebrado em situações marcadas pelo afeto e pela intimidade, especialmente em reuniões realizadas entre mulheres.
Após um longo período de esquecimento (a última grande exposição individual de Maria Auxiliadora aconteceu em 19 81 , no MASP ), esta mostra tem o objetivo de renovar o interesse por esta artista brasileira fundamental, para além das preconceituosas, paternalistas e redutoras categorias de “arte naïf” ou “primitiva”. Seu trabalho propõe uma resposta à questão crucial para qualquer museu que deseje efetivamente dialogar e ser relevante para o contexto em que se encontra inserido: de que modo a arte pode representar outras culturas, que não a das classes dominantes?
Maria Auxiliadora nos oferece assim uma vida (e uma arte) para nosso tempo — no MASP , em São Paulo, no Brasil e no mundo.
Maria Auxiliadora: vida cotidiana, pintura e resistência tem curadoria de Adriano Pedrosa, diretor artístico do MASP, e Fernando Oliva, curador do Museu. O escritório de arquitetura METRO Arquitetos Associados assina a expografia da mostra.
Mostra com gravuras, pinturas e fotos do artista em seu ateliê. Curadoria de Richard Riley e Delphine Allier, com a colaboração de Teixeira Coelho. Realização: MASP e British Council. Viabilizado por HSBC, via Lei Federal de Incentivo à Cultura.
A mostra LUCIAN FREUD: Corpos e Rostos, que traz pela primeira vez ao Brasil um dos principais artistas do pós-guerra, tem foco em sua produção gráfica e apresenta dois períodos marcantes em sua carreira como gravurista: o primeiro deles na década de 1940, quando ainda jovem fez um pequeno número de gravuras experimentais e, depois de um longo intervalo, um segundo momento a partir da década de 1980, quando criou uma sucessão de obras extraordinárias usando a técnica da água-forte. Estes trabalhos mais recentes incluem uma ampla seleção de nus e retratos e foram descritos como “uma conquista paralela à suas pinturas”.
Com curadoria de Richard Riley e Delphine Allier e colaboração de Teixeira Coelho, a exposição traz ainda ao público brasileiro seis quadros: um autorretrato do começo de sua carreira e cinco pinturas de diferentes décadas, incluindo Girl with Roses, de 1947-48.E se completa com a exibição de 28 fotos tiradas por David Dawson, seu assistente, amigo e fotógrafo oficial que além de registrar os movimentos do artista e seus modelos no ateliê, costumeiramente servia ele próprio de modelo para Lucian Freud, que nasceu em 1922 na Alemanha e naturalizou-se inglês em 1939.
Em suas fotos Dawson buscava imprimir a mesma dramaticidade das pinturas de Lucian Freud, jogando com a luz e os objetos em cena em registros do artista e das pessoas que ele retratava, como será visto nesta exposição. “As fotografias pessoais de David Dawson, assistente de Freud por mais de vinte anos, trazem uma visão única da vida do artista”, observa Richard Riley, chefe de Exposições e Artes Visuais no British Council e curador desta mostra que integra o Transform, programa de arte da instituição.
A exposição, que fica até 02 de fevereiro de 2014 no primeiro andar do MASP, tem patrocínio do HSBC via Lei de incentivo à cultura. "Apoiar o câmbio cultural faz parte da nossa estratégia de patrocínio global reforçando o posicionamento internacional do banco e valores como conectividade, integridade e ser aberto a diferentes culturas e tradições. É uma satisfação trazer pela primeira vez ao Brasil as obras de Lucian Freud, um dos principais artistas do pós-guerra", conclui Renata Brasil, diretora de marketing para pessoa jurídica e patrocínios institucionais do HSBC.
Palestra com David Dawson
No dia 27 de junho, às 15h, David Dawson dará uma palestra gratuita sobre seu trabalho como assistente e fotógrafo oficial de Lucian Freud no Pequeno Auditório do MASP.
Serviço Educativo
Como para as demais exposições temporárias e mostras de obras do acervo realizadas pelo MASP, Lucian Freud: Corpos e rostos tem um programa educativo elaborado especialmente para atender aos visitantes, professores e alunos de escolas públicas e privadas. As visitas orientadas são realizadas por uma equipe de profissionais especializados. Informações: 3251.5644, ramal 2112.
Lucian Freud, por Teixeira Coelho:
Lucian Freud praticou o que se pode descrever como humanismo incômodo. “Pinto o que vejo, não o que você quer que eu veja”, costumava dizer aos que o censuravam por um verismo que julgavam exagerado. De fato, Lucian Freud mostrava um comprometimento total com seus modelos, persistentemente buscando apreender toda sua verdade, que ele via como algo invasivo e perturbador, não tranquilizador. Essa persistência o levava a gastar 18 meses de trabalho com uma modelo, sete noites por semana, para chegar à obra final.
Outra persistência sua foi com o figurativismo, que não abandonou em nenhum momento. Essa insistência chegou mesmo a causar escândalo quando, em 1976, uma exposição na Hayward Gallery de Londres organizada pelo também artista R.B.Kitaj defendeu o que este chamava “Escola de Londres”, reunindo artistas como o próprio Lucian Freud, Frank Auerback, Francis Bacon, Leon Kossof e outros que faziam do figurativismo um elemento de resistência contra o abstracionismo dominante. Abstracionismo, com Lucian Freud, só aquele acidentalmente feito por seus pincéis quando os limpava nas paredes de seu ateliê, sobrepondo mancha de tinta a mancha de tinta...
Em nova mostra concebida com obras de seu acervo O triunfo do detalhe. Os mestres antigos: o retrato celebra a arte do retrato e do auto-retrato no período que antecede o Modernismo, do século 16 ao início do 19. São quinze retratos escolhidos pelo curador do MASP Teixeira Coelho, reunindo alguns dos maiores mestres da arte desde o Renascimento: Rembrandt, Tiziano, Velázquez, Goya, Hals, Rubens, Van Dyck, Gainsborough, Allori e Paris Bordon. Com apoio da Lei de incentivo à Cultura e patrocínio do Bradesco e Bradesco Seguros, a mostra ficará no 1º andar do museu.
Para Teixeira Coelho pode-se observar, nesses grandes mestres, a importância central que o detalhe na arte assume a partir do século 16. “Como observa Daniel Arasse, o detalhe torna-se o melhor índice da excelência do artista. É no detalhe que se concentra, mesmo, a ‘verdade em pintura’, um traço que na arte moderna aos poucos desapareceria para ceder lugar à impressão geral e à ideia abstrata”.
Destaques, por Teixeira Coelho:
Retrato do Cardeal Cristoforo Madruzzo – Tiziano Vecellio, 1552 – Madruzzo, como príncipe-bispo de Trento, foi membro do Concílio de mesmo nome do qual saiu a Contra-reforma católica. Os objetos na tela simbolizam poder do retratado, sua função (o anel cardinalício, as folhas sobre a mesa, com texto outrora legível). O relógio marca duas e trinta, aludindo a um evento do Concílio. Indica também a transitoriedade do tempo. Tiziano, usando uma paleta de poucas cores, promove uma difusão tonal de modo que os vermelhos da cortina se lançam à face da personagem e avivam o solo. Os vincos da cortina sugerem figuras, como um perfil leonino com o qual Tiziano elogia o retratado em sua condição de astuto mediador entre o papa e o imperador.
O Retrato do Conde-Duque de Olivares – Diego Rodríguez de Silva Velázquez, 1624 – Três aspectos da tela são expressivos: a roupa, o gesto, a efígie. A roupa explicita a desproporção do corpo em relação à cabeça, talvez reduzida em proporção de modo a chamar a atenção para os detalhes do poder: a chave e esporas douradas identificam-no como camareiro-mor e grande escudeiro de Filipe IV, de quem foi primeiro-ministro. Sobre o gibão aparecem a corrente e brasões da ordem militar de Calatrava. Os gestos acentuam a imponência, visível nos braços e nas mãos.
Retrato do Cardeal Luis Maria de Borbon y Vallabriga – Francisco José de Goya y Lucientes, 1798-1800 – O retrato de Vallabriga é correto e suntuoso. Vallabriga, cardeal aos 23 anos, momento deste retrato, era filho de um nobre que fizera a Goya as primeiras encomendas recebidas pelo artista. Além do realismo geral da representação, alguns detalhes se sobressaem, como a faixa vermelha e a insígnia. Mas outros detalhes e signos do poder estão ausentes e são em muito menor número do que nas telas de Tiziano e Rubens, como se Goya quisesse realçar antes os dons intelectuais do cardeal que suas qualidades materiais.
Retrato da Condessa de Casa das Flores – Francisco José de Goya y Lucientes, 1790-97 – Como em outros retratos de Goya, também neste o mundo interior da retratada prevalece sobre seu aspecto exterior e os signos materiais. O vestido branco é soberbo mas, comparado ao retrato de Maria Olycan, de Franz Halls, também nesta sala, fica evidente como, quase um século e meio antes, na tela de Halls, os detalhes da indumentárias, em especial a golilha branca, são uma figura da obra tão importante quanto o rosto do retratado.
Oficial Sentado – Franz Hals, 1631 – O personagem aparece sentado de lado, inclinado para trás, com o cotovelo direito – que se projeta para fora tela – apoiado sobre o espaldar da cadeira. O chapéu desengonçado sobressai com sua grande aba frontal. Seus braços formam um polígono dinâmico de cinco lados em que as mãos, curvas, permanecem contíguas, perfazendo o eixo oblíquo da composição. Com isso o retrato ganha vida, reiterada não apenas pela pincelada empastada, multidirecional, das mangas que produzem saliências agudas, mas também pela luz dourada que banha a face deste personagem de identidade desconhecida, talvez um miliciano de Haarlem, como o título da obra sugere.
Maria Pietersdochter Olycan – Franz Hals, 1638 – Esta obra deve ser observada em comparação ao retrato da Condessa de Casa Flores, de Goya. Como em outros retratos de Goya, também neste o mundo interior da retratada prevalece sobre seu aspecto exterior e os signos materiais. O vestido branco é soberbo, mas, comparado ao retrato de Maria Olycan, de Franz Hals, também nesta sala, fica evidente como, quase um século e meio antes, na tela de Hals, os detalhes da indumentária, em especial a golilha branca, são uma figura da obra tão importante quanto o rosto do retratado.
Autorretrato com barba nascente – Rembrandt Harmensz van Rijn, c. 1635 – “Rembrandt pinta a si mesmo encarando o espectador, do qual está próximo. O artista opera com um claro-escuro teatral que, além de se projetar em diagonal à face da figura, tem transparência tonal que envolve o aveludado do casaco (que impressiona o olho como se este pudesse substituir o toque dos dedos), a maciez do cabelo, a suavidade da boina com o fundo tenebrista. Os detalhes da golinha branca são fortes e impressionantes, mas menos intensos em volume do que nos retratos militares de Franz Hals. Os olhos do artista, porém, são de uma intensidade realista, no detalhe, que torna evidente o principal tema do pintor: o mundo interior do retratado, de si mesmo. Um dos mais importantes retratistas da história, neste aspecto Rembrandt e Goya se aproximam, por caminhos diversos.
Retrato de Alvise Contarini (?) – Paris Bordon, 1525/50 – “Retrato de datação mais remota no Renascimento italiano dentro da coleção MASP, esta obra de Bordon tem em comum com a de Tiziano, na sala seguinte, alguns detalhes comuns como o relógio de mesa, signo da passagem do tempo e da pequenez das vaidades humanas (vanitas vanitatem). De fato, o retratado é representado numa soberba indumentária cujo luxo e voluptuosidade que quase pode ser sentida realmente, e não apenas virtualmente, pelo observador. Este retrato, no entanto, por apresentar o retratado numa espécie de plano americano (no cinema, umplano que apanha a personagem até a altura do joelho aproximadamente), permite uma proximidade maior entre a figura e esse mesmo observador, o que dá à obra um caráter mais intimista.
José Pancetti, Autorretrato com marreta, 1941
Candido Portinari, Retirantes, 1944
Para a edição de novembro, será proposta uma conversa sobre o trabalho de Rembrandt van Rijn, Retrato de jovem com corrente de ouro (Autorretrato com corrente de ouro), c. 1635, com o de Dora Longo Bahia, Campo e contracampo (Presidente do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand e 11 de junho de 2013), de 2017.
Ponto de encontro: entrada da mostra Acervo em Transformação, 2º andar, às 16 horas.
Retire seu ingresso no site para garantir a entrada no museu.
Para a edição do dia 7 de maio propomos uma conversa sobre a pintura de Tarsila do Amaral, Composição (Figura Só), 1930 e Tarsila do Amaral, Autorretrato com vestido laranja, 1921
Mediação: Daniela
Ponto de encontro: na entrada do Acervo em Transformação, 2º piso, às 16 horas.
Retire seu ingresso no site para garantir a entrada no Museu.
Para a edição do dia 6 de agosto, propomos uma conversa sobre as obras Navalha suiça XV, 2015, de Pedro Reyes e Autorretrato com marreta, 1941, de José Pancetti.
Ponto de encontro: na entrada do Acervo em Transformação, 2º piso, às 16 horas.
Retire seu ingresso no site para garantir a entrada no Museu.
Créditos da imagem:
Pedro Reyes, Navalha suiça XV, 2015. Doação do artista, 2021. Foto: Edouard Fraipont
O seminário Gauguin: o outro e eu reunirá estudiosos que lançam novos olhares sobre a obra de Paul Gauguin (1848-1903), tendo como foco o trabalho produzido pelo artista no Taiti, em Atuona e em Hiva Oa, assim como seus autorretratos, com o objetivo de apresentar temas como a autorrepresentação do artista e mudanças na compreensão da identidade individual diante da alteridade na cultura moderna.